Depois de vivenciar tempos difíceis no triênio 2020/2022, por conta da pandemia da Covid-19 e, mais tarde, pela introdução da norma P-8 de emissões (equivalente ao Euro VI), que dificultaram as vendas de veículos no país, o mercado de caminhões e ônibus volta a mostrar forte recuperação. Para alegria da vasta cadeia de suprimentos da indústria automotiva, incluindo os fabricantes de motores, eixos e transmissões para veículos comerciais. Como revelam as entrevistas com representantes do setor, para compor esse Panorama 204/2025 do Mercado de Motores, Eixos e Transmissões, tema de capa de Frota&Cia de setembro, disponível no portal da publicação.
De fato, segundo a Anfavea, que representa os fabricantes de veículos, a produção de caminhões registrou uma evolução de 40,7% de janeiro a agosto desse ano, na comparação com igual período de 2023, totalizando 89,4 mil unidades ante 61,5 mil. O mesmo ocorreu com a produção de chassis de ônibus que avançou 41% no mesmo intervalo, correspondendo a 19 mil unidades versus 13,4 mil registradas em 2023.
“O melhor conhecimento da tecnologia Euro VI e o TCO (Custo total de operação) tem encorajado os transportadores a investirem em veículos novos”, explica Antonio Almeida, diretor de Vendas On-Highway, da Cummins.
A opinião tem o endosso de seu companheiro de indústria, o vice-presidente da Divisão de Veículos Comerciais da Voith Turbo, Rogério Pires (foto), ao afirmar que o mercado de powertrain voltou à normalidade, depois do choque inicial provocado pela introdução da tecnologia Euro VI. “As montadoras tem buscado lançar novos modelos, principalmente na linha de caminhões vocacionais. Então, o mercado tem tido uma evolução positiva e, seguramente, os frotistas contam com um portfólio de escolha bastante variado”.
Para Eduardo Manenti (foto), diretor da Suspensys, que integra o Grupo Randoncorp, a produção de mais de 2.000 caminhões em agosto é motivo de comemoração. Segundo ele, a puxada maior vem do segmento de caminhões pesados, bastante impulsionada pelo agronegócio, além dos ônibus por conta da renovação de frotas. “Até mesmo o mercado de reposição vem registrando forte crescimento, de mais de 40% no caso da Suspensys, como resultado da ampliação do portfólio e o aumento da capacidade produtiva”.
Projeções para 2025
Diante desse cenário, as perspectivas para 2025 são igualmente animadoras. “As projeções para o ano apontam uma continuidade da recuperação, embora em percentuais menos expressivos”, observa Sérgio Kramer (foto), diretor geral de Veículos Comerciais e Fora-de-Estrada da Eaton. A inversão na tendência, na visão do executivo, é o eventual aumento nas taxas de juros dos financiamentos, assim como a quebra da safra de grãos em decorrência dos fatores climáticos extremos.
Mais otimista, o diretor da Voith, Rogério Pires, aposta nos investimentos em infraestrutura prometidos pelo governo federal, com vistas ao aumento da produtividade nacional, que podem contribuir para o bom desempenho da indústria de caminhões e ônibus. “Projeta-se para 2025 uma grande expansão das obras públicas, da mineração e outros setores estratégicos da economia brasileira. Além de programas de incentivo para renovações de frota e adoção de tecnologias sustentáveis”, completa de outro lado o diretor de Operações South America da Allison Transmission, Gabriel Ruggiero (foto).
Mesma opinião tem o representante da Cummins, Antonio Almeida, com base nas projeções do Sindipeças. “De acordo com a entidade, o crescimento do setor de caminhões será de aproximadamente 4,7%, enquanto para os ônibus a estimativa é avançar ainda mais, em torno de 7,9% na comparação com 2024”. Em adição, o executivo lembra que se o PIB crescer 1,95%, conforme o previsto, é possível acreditar no aumento das vendas do setor de powertrain.
Tal otimismo também move o gerente Sênior de Vendas da Cummins Drivetrain ank Brake Systems, nova denominação da Meritor, Mauricio Biadola(foto), que aposta em uma evolução de 4% nas vendas de veículos comerciais em 2025. “Não sem motivo, as montadoras de caminhões e ônibus anunciaram investimento de R$ 6,8 bilhões para os próximos anos, apostando no aumento da demanda, fato que beneficia diretamente o setor de autopeças”, admite Biadola.
Avanço da eletromobilidade
Mais interessante de tudo são as perspectivas que se abrem com o avanço da eletromobilidade no país, não apenas no mercado de autos de passeio mas, também, de caminhões e ônibus. Nas contas de Carlos Tavares (foto), da FPT Industrial, as vendas com novas tecnologias de propulsão no segmento de pesados podem representar 60% em 2040. Enquanto nas aplicações em ônibus urbanos, as versões elétricas podem ultrapassar 50% já em 2035. “Esse avanço envolve o desenvolvimento de um ecossistema abrangente, que inclui a cadeia de fornecedores, infraestrutura de recarga, geração e distribuição de energia, além da produção de biocombustíveis”, comenta Tavares.
Antonio Almeida (foto), da Cummins, observa que o mercado de motores para veículos comerciais está em plena transformação, com a eletromobilidade assumindo um importante papel na busca por soluções mais sustentáveis e eficientes. “Isso tem impulsionado avanços tecnológicos significativos, especialmente no desenvolvimento de baterias, resultando em melhorias na autonomia veicular, no rendimento energético, vida útil e densidade, além da redução de custos e preços de aquisição dos veículos elétricos”.
Ainda que enaltecida como alternativa do futuro, a eletrificação da frota demanda, por outro lado, uma análise um pouco mais ampla envolvendo todo o ciclo do veículo. Não só na questão da utilização, como na produção e até mesmo o descarte das baterias, alerta Rogério Pires, da Voith.
Caio Silva (foto), que atua como gerente Sênior de Negócios ZF América do Sul, admite que a eletromobilidade é uma realidade em todo o mundo, mas deve substituir apenas parcialmente o volume de veículos comerciais movidos a explosão. Ao seu ver, o que se prevê é que na Europa, EUA e Ásia, os mercados serão majoritariamente de veículos elétricos. “Já no caso do Brasil, é certo que teremos uma evolução na produção de veículos elétricos, mas o diferencial a nossa região será o avanço em tecnologias sustentáveis para veículos movidos a motores à explosão”. Em outras palavras, o parque automotivo nacional deve se especializar em novas tecnologias com motores de última geração movidos a etanol, gás, biocombustíveis e, também, híbridos.
Apesar de ser uma tendência global, ainda há muitas incertezas quanto à eletrificação total das frotas, devido às limitações tanto tecnológicas quanto de infraestrutura, reforça Gabriel Ruggiero, da Allison Transmission. Por outro lado, novas tecnologias que não eram tão utilizadas estão ganhando espaço no mercado de veículos comerciais, como a adoção de motores movidos a Gás Natural Comprimido (GNC) que apresentam uma redução significativa no volume de emissões, explica o executivo.
Fenatran 2024
Para encerrar o ano com chave de ouro, a indústria de powertrain aposta ainda em um fator adicional, que deve impulsionar as vendas de veículos comerciais no país. É a realização da Fenatran, a principal feira do transporte rodoviário de cargas da América Latina, prevista para o período de 4 a 8 de novembro no São Paulo Expo, localizado na capital paulista.
Todos os entrevistados foram unânimes em afirmar que a expectativa em relação à feira é a melhor possível, por conta do bom momento que vive a indústria automotiva. Para os fabricantes de motores, eixos e transmissões em particular, a transição energética será a “bola da vez” e o principal tema que irá nortear a apresentação de novos produtos.
Diante da pressão pela redução de emissões que contribuem para o efeito estufa na atmosfera, com foco na descarbonização do transporte, não faltarão nos estandes veículos e componentes baseados na eletromobilidade ou soluções alternativas ao diesel como o gás natural e o biometano, entre outras. Sem contar as transmissões automáticas, automatizadas, híbridas, além dos eixos elétricos e uma vasta gama de produtos que prometem a menor pegada ambiental e a redução dos custos do transporte para um público ávido de novidades.
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