A humanidade caminha para a sua extinção. Não há boas práticas de ESG, compromisso com o Acordo de Paris ou políticas públicas que sejam suficientes para frear as mudanças climáticas, que nos impõem rapidamente uma realidade de eventos naturais e desastres ambientais cada vez mais severos. Sim, eu sei que essa é uma mensagem forte e já adianto que o vídeo é pessimista, embora seja importante manter a esperança. Por isso, convido vocês a imaginarem um novo mundo melhor. Mas, para isso, preciso que você se comprometa comigo a manter um diálogo franco, de peito aberto e como adultos. Talvez a gente tenha que rever muita coisa em que acreditamos para compreender as responsabilidades pelas mudanças climáticas. Só assim poderemos buscar uma nova realidade com a urgência necessária.
Para falar sobre a era do Antropoceno, que é justamente este período de tempo marcado pela ampla e negativa interferência da humanidade sobre a Terra, precisei buscar informações robustas sobre o tema, em que me aprofundei em livros do filósofo japonês Kohei Saito, do filósofo estadunidense Noam Chomsky — que debateu o tema com o economista Robert Pollin e também com o ex-presidente uruguaio Pepe Mujica em obras distintas —, bem como em estudos recentemente divulgados pela Oxfam e pelo Greenpeace. Em comum, observamos críticas contundentes e devidamente fundamentadas ao cerne do capitalismo.
O que você entenderá a partir de agora é que sim, há responsáveis pela emergência climática e os desastres ambientais, e que eles não são invisíveis ou abstratos. O que importa para eles é manter uma hegemonia global e não a segurança das pessoas, que era e continua sendo considerada massa irrelevante e permanentemente mantida na obscuridade informativa.
Mesmo diante das promessas de grandes investimentos para eletrificar a mobilidade, tudo o que é possível está sendo feito para maximizar o uso de combustíveis fósseis, incluindo o carvão, que é um dos piores para o meio ambiente. Dessa forma, haverá tempo hábil para salvar o planeta, para que toda a humanidade possa sobreviver ao holocausto ecológico e viver com dignidade? Aqui já se faz necessária uma escolha: pensar e tomar decisões como Estado ou como espécie? Veremos as devidas implicações ao longo deste conteúdo.
O estudo “A Custas de Quem?”, da Oxfam, detalha as origens e os motivos do fluxo econômico em favor de pessoas e setores privilegiados, abordando a desigualdade e a exploração perpetuadas por instituições globais e corporações multinacionais, destacando o legado do colonialismo e seus impactos no Sul Global — termo que indica uma região ou um povo que sofre os danos causados pela globalização. O Banco Mundial e o Fundo Monetário Internacional (FMI), criados há 80 anos — mais precisamente em 27 de dezembro de 1945, por imposição estadunidense após sugestão de Harry Dexter White, então subsecretário de Finanças dos Estados Unidos à época —, ainda são dominados por países do G7, que detêm grande poder de voto, apesar de representarem uma pequena parcela da população mundial. São instituições que influenciam políticas econômicas em países de baixa e média renda, muitas vezes exigindo cortes em gastos públicos essenciais, como saúde e educação, em troca de empréstimos. Durante a pandemia de COVID-19, o FMI teria cortado bilhões de dólares de orçamentos salariais em 15 países, resultando na perda de milhões de empregos essenciais.
As corporações multinacionais, herdeiras do colonialismo, continuam a explorar trabalhadores do Sul Global, especialmente mulheres, em cadeias de suprimentos globais, onde os salários são significativamente mais baixos do que no Norte Global. A extração de recursos naturais e a exploração de mão de obra barata perpetuam a dependência econômica e a desigualdade. Além disso, o colonialismo deixou um legado de danos ambientais, como desmatamento e extinção de espécies, e contribuiu para a crise climática, da qual o Norte Global tem maior responsabilidade histórica, mas o Sul Global sofre os maiores impactos.
Entre os conhecidos mecanismos de extração de riqueza do Sul Global para o Norte Global, podemos elencar fatos como manipulação do sistema financeiro, comércio injusto, exploração de trabalhadores, pagamentos de dívidas e repatriação de lucros corporativos. Esses mecanismos perpetuam a desigualdade e a pobreza, deixando muitas pessoas vulneráveis a desastres climáticos e mudanças econômicas.
Já o estudo “Por que lutar por Justiça Climática”, do Greenpeace, destaca que, sozinhas, as emissões dos mais ricos do planeta serão suficientes para provocar 1,3 milhão de mortes relacionadas ao calor entre 2020 e 2100. Levaria cerca de 1.500 anos para que uma pessoa entre os 99% da população produzisse tanto CO₂ quanto os bilionários mais ricos produzem em um ano. O 1% mais rico do planeta poluiu na mesma proporção que cinco bilhões de pessoas, que correspondem a ⅔ da humanidade e que foram responsáveis por apenas 16% das emissões globais em 2019.
Portanto, a fatia dos privilegiados, que lucram com indústrias poluentes e possuem um estilo de vida que provoca grandes emissões, precisa pagar um preço proporcional às suas ações. Não dá para esperar que eles tenham empatia com relação ao tema, já que não são os primeiros a sentirem as consequências mais graves do superaquecimento do planeta e ainda poderão manter um estilo de vida privilegiado, até ultrajante, mesmo diante dos piores cenários possíveis.
Vamos esclarecer que as mudanças climáticas são um conjunto de alterações no clima do planeta, que, desde o início da industrialização mundial, têm sido impulsionadas por ações que emitem gases de efeito estufa.
No Brasil, a alteração do uso do solo é a principal responsável pelas mudanças climáticas, incluindo queimadas e desmatamento. A queima de combustíveis fósseis para a geração de energia industrial e veicular também aparece como uma significativa propulsora de gases de efeito estufa, funcionando como uma capa planetária que retém o calor e aumenta as temperaturas. Tais alterações têm provocado eventos climáticos extremos, incluindo verdadeiras tempestades, secas e ondas de calor e de frio acentuadas. O documento revela que 63% dos brasileiros se sentem inseguros em relação a eventos climáticos extremos.
Em termos de ações práticas e imediatas, os governos devem investir em gestão de risco e desastres, que consiste em identificar os riscos nos territórios, delimitar as áreas que podem ser mais impactadas, entender as fragilidades do meio físico e a vulnerabilidade social, bem como antecipar os impactos para que as pessoas possam se prevenir.
Para uma adaptação climática, fazem-se necessárias um conjunto de ações nos territórios e nas cidades, com a finalidade de reduzir as consequências da crise climática e os impactos desiguais por meio de políticas públicas que se antecipem aos eventos extremos já previstos e garantam a resiliência dos grupos sociais que mais sofrem historicamente com a violação de uma série de direitos fundamentais.
Muito se fala nos refugiados climáticos mundo afora, mas este é um problema crítico no Brasil. O número de deslocamentos internos no mundo chegou a 71 milhões em 2022, o que representa um crescimento absurdo de 20% sobre 2021. O Brasil registrou a maior taxa das Américas, com 708 mil deslocamentos motivados por chuvas fortes. Vale lembrar que este dado é de 2022 e, portanto, não considera os refugiados das chuvas extremas que ocorreram no Rio Grande do Sul no início de 2024. Segundo Noam Chomsky, “a crise dos refugiados é uma grave crise moral e cultural do Ocidente”.
Estes fatos justificam a desconfiança da população com relação ao poder público, considerando que 77% dos moradores das capitais brasileiras não confiam na capacidade das prefeituras em prevenir ou reduzir os impactos de desastres. Este índice torna flagrante o chamado “racismo ambiental”, termo cunhado pela primeira vez em 1981 por Benjamin Chavis, líder afro-estadunidense de direitos civis. Para ele, é evidente “a discriminação racial na elaboração de políticas ambientais, aplicação de regulamentos e leis, e direcionamento de comunidades negras para eliminação de resíduos tóxicos e localização de indústrias poluentes”.
A agricultura industrial corporativa é uma das principais responsáveis pelas mudanças climáticas, contribuindo com cerca de 25% das emissões de gases de efeito estufa, como CO₂, metano e óxido nitroso. Esse modelo de agricultura também causa degradação do solo, desertificação, escassez de água potável, perda de biodiversidade, aumento da resistência a pragas e poluição das águas.
De acordo com um estudo de Noriko Hosonuma, 40% do desmatamento em países em desenvolvimento está ligado ao agronegócio, principalmente para a criação de pastagens para gado. Outros 33% são destinados à agricultura de subsistência, e 10% são usados para a construção de estradas e infraestrutura para escoamento da produção. No total, 85% do desmatamento está diretamente associado à agropecuária.
Segundo Robert Pollin, as ações de florestamento e reflorestamento podem desempenhar um papel importante como parte de um conjunto mais amplo de estratégias para reduzir as emissões de carbono, já que as florestas têm a capacidade natural de absorver grandes quantidades de CO₂. Estima-se que o florestamento possa diminuir os níveis de CO₂ em 0,5 a 3,5 bilhões de toneladas por ano até 2050. No entanto, considerando que as emissões globais atuais de CO₂ são de aproximadamente 33 bilhões de toneladas, o florestamento deve ser visto como uma medida complementar, e não como a principal solução, dentro de um programa mais amplo que inclui a transição para energias limpas e a meta de zerar as emissões até 2050.
O clima está mudando de forma rápida e devastadora como consequência da relação predatória e comercial que o capitalismo desenvolveu com a natureza, sobretudo no último século, com o crescimento exponencial das emissões de gases de efeito estufa provenientes da queima de combustíveis fósseis e do desmatamento de biomas. Os eventos climáticos extremos afetam de forma desigual pessoas negras, indígenas, populações tradicionais, idosos, crianças, mulheres e demais grupos vulneráveis.
Para o cientista australiano Andrew Glikson, especialista no tema, já ultrapassamos o Antropoceno e ingressamos na era do Plutoceno, na qual o ecossistema terrestre será determinado pela quantidade de plutônio no ambiente. Grande parte do globo terrestre ficará tão contaminado por radiação e plutônio que, somados ao aquecimento global, a Terra será inabitável.
A emergência climática não é um problema futuro, mas uma realidade atual. O permafrost, que é o solo que permanece congelado por mais de dois anos, sendo formado por terra, rochas, matéria orgânica, areia e gelo — que age como cimento —, contém imensas quantidades de carbono armazenado e está derretendo, liberando a substância como nunca antes observado. Ele chega à atmosfera na forma de metano, que é um gás mais letal que o CO₂, acelerando ainda mais o processo de catástrofe ambiental e climática. A maior parte do permafrost do planeta está no Ártico, mas também está presente na Antártida e em altas montanhas, sendo encontrado principalmente na Rússia, no Canadá e no Alasca. Além de contribuir para o aquecimento global, seu derretimento pode liberar vetores de infecções mortais, especialmente perto de cemitérios, assim como as alterações na temperatura do solo afetam a qualidade do ar, as chuvas e a drenagem. Por isso, o permafrost é uma das grandes ameaças para o planeta.
Kohei Saito, filósofo japonês, alerta que “de boas intenções o inferno está cheio” e que medidas como trocar o carro a gasolina por um elétrico ainda é muito pouco. Os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS), estabelecidos pela ONU e promovidos por governos e grandes corporações, não resolvem o problema. Os ODS são a versão moderna do “ópio do povo”, ao proporcionar alívio ao sofrimento provocado pela duríssima realidade do capitalismo. ESG, ODS, Acordo de Paris são coisas “para inglês ver”, pois o perigo climático não é algo que somente começará em 2050, mas é algo que já começou.
Segundo Chomsky, são as pessoas que hoje estão vivas que decidirão o destino da humanidade e o de milhares de espécies que destruímos em um ritmo não visto há pelo menos 65 milhões de anos, quando um imenso asteroide atingiu a Terra e encerrou a era dos dinossauros, permitindo que alguns pequenos mamíferos evoluíssem e se tornassem “clones do asteroide”, com a diferença de que os clones possuem escolhas.
Casos conhecidos de grandes desastres ambientais, incluindo o vazamento de petróleo no Golfo do México pela British Petroleum (BP), os incêndios na Amazônia provocados pelo agronegócio, as tragédias de Brumadinho e Mariana causadas pela Vale, entre outros exemplos, não são fatalidades, não são casualidades. Desastres causados pelo homem são desastres anunciados, sempre. De acordo com Saito, isso acontece porque a vida tranquila nos países desenvolvidos só é possível com a exploração da mão de obra e dos recursos naturais do Sul Global.
Pollin e Chomsky reforçam que o neoliberalismo desempenhou um papel crucial no agravamento da crise climática. O liberalismo clássico parte do princípio de que todos devem ter liberdade total para buscar seus interesses individuais dentro do sistema capitalista. Nesse contexto, os governos permitem que grandes corporações operem com pouca ou nenhuma restrição, visando maximizar seus lucros. O resultado é um sistema que beneficia os capitalistas, enquanto impõe um capitalismo de mercado implacável para o restante da sociedade.
Em 1982, pesquisadores da ExxonCorporation (atual ExxonMobil) previram que, até 2060, a queima de petróleo, carvão e gás natural para produção de energia elevaria a temperatura média do planeta em aproximadamente 2°C, o que desencadearia grandes perturbações climáticas. Esses distúrbios, que começaram a se intensificar a partir dos anos 1980, tornaram-se cada vez mais frequentes e severos. Em 1988, pesquisadores da Shell Corporation chegaram a conclusões semelhantes. No entanto, ambas as empresas optaram por ocultar essas descobertas cruciais.
Em 1988, o geofísico James Hansen foi o primeiro a alertar publicamente sobre os riscos das mudanças climáticas. Em resposta, a ExxonMobil iniciou um programa negacionista, focando em semear dúvidas, já que a negação direta era facilmente refutável. É crucial analisar com cuidado as afirmações dos grandes sistemas de propaganda, especialmente considerando que o capitalismo cresceu intimamente ligado à queima de combustíveis fósseis para energia e maquinário.
Os sociólogos alemães Ulrich Brand e Markus Wissen denominam de “estilo de vida imperialista” aquele dos países desenvolvidos, que é baseado na exploração de recursos e energia do Sul Global. Essa parte do mundo depende da produção e consumo gerados pelo estilo de vida imperialista, e não há escolha a não ser depender do pleno funcionamento deste — e quanto maior o sacrifício, maior o lucro das grandes empresas. Essa é a lógica do capital. Se esse sistema social continuar visando ao crescimento econômico ilimitado, é uma consequência natural que o meio ambiente global caia em uma situação crítica.
O capitalismo tem se apropriado de tudo o que consegue alcançar, desde recursos naturais como petróleo, nutrientes do solo e metais preciosos, até mesmo a força de trabalho humana. Esse modelo extrativista impõe uma pressão imensa sobre o planeta. Da mesma forma que os limites do “trabalho barato” estão se esgotando, as fronteiras da “natureza barata”, das quais o capitalismo extrai recursos e para onde desloca os impactos ambientais, também estão se tornando cada vez mais escassas.
Não importa o quão eficiente o capitalismo possa parecer, a realidade é que o planeta possui recursos finitos. O sistema capitalista busca a expansão infinita de valor, mas esbarra na finitude dos recursos naturais. As chances de que nações ou grandes corporações adotem medidas em escala suficiente para enfrentar as mudanças climáticas são mínimas, por isso que a grande maioria das ações de ESG são “historinhas para boi dormir”. Como se não bastasse, não é incomum que as corporações responsáveis por danos ambientais se recusem a assumir a responsabilidade, argumentando a falta de evidências concretas que comprovem a relação causal entre suas ações e os impactos gerados. Um exemplo aviltante disso foi a absolvição da Vale, juntamente com as empresas Samarco e BHP Billiton, em uma ação criminal pelo rompimento da Barragem de Fundão, em Mariana, em 2015, garantida por uma decisão judicial de novembro de 2024, que considerou que não havia provas suficientes para estabelecer a responsabilidade criminal das empresas envolvidas. Ou seja, ninguém foi preso, e tais empresas seguem operando a todo vapor com os mesmos objetivos.
Sabemos que os riscos e as oportunidades estão distribuídos de maneira extremamente desigual. Por exemplo, para que o centro continue a se beneficiar, as periferias precisam permanecer em desvantagem. O planeta se tornará inabitável antes que o capitalismo entre em colapso. A escassez de combustíveis fósseis não é o único limite que enfrentamos. Na verdade, essa nem sequer é a questão mais urgente. Antes que o petróleo acabe, perderemos a capacidade de habitar a Terra. A crise climática revela à humanidade a realidade nua e crua de que precisamos repensar radicalmente nosso modo de vida, que é baseado no imperialismo, no extrativismo e na externalização de custos.
Melhorias incrementais não são suficientes. O capitalismo mantém seu crescimento econômico transferindo os impactos ambientais para outras regiões. Uma das políticas que gera grandes expectativas é o Green New Deal, ou Novo Acordo Verde, em português. Essa iniciativa prevê estímulos fiscais em larga escala e investimentos públicos para promover o uso de energias renováveis e veículos elétricos. Um de seus objetivos é gerar empregos bem remunerados. No contexto do Antropoceno, o neoliberalismo já não se sustenta como modelo válido.
No entanto, é crucial focar na relação entre crescimento econômico e degradação ambiental. Um exemplo de “decoupling absoluto”, que significa dissociar atividades tradicionalmente interligadas, seria a adoção em massa de veículos elétricos, que não emitem CO₂. A redução do uso de carros movidos a gasolina ou veículos comerciais a diesel diminui as emissões de carbono, enquanto o crescimento econômico é mantido por meio da venda de veículos elétricos. Embora seja tecnicamente possível alcançar emissões zero em cem anos, isso pode ser tarde demais para evitar danos irreversíveis.
De acordo com Johan Rockström, especialista no tema, a solução é clara: ao abandonar o crescimento econômico e reduzir o tamanho da economia, torna-se proporcionalmente mais fácil atingir as metas de redução de CO₂. Essa seria uma decisão crucial para impedir a destruição global e preservar as condições necessárias para a prosperidade humana.
O capitalismo busca aumentar a produtividade do trabalho para reduzir custos. Se a produtividade aumenta, é possível produzir a mesma quantidade de bens com menos trabalhadores. Se a economia não crescer, isso resultará em desemprego. No entanto, em um sistema capitalista, os desempregados enfrentam dificuldades para sobreviver, e os políticos evitam altas taxas de desemprego. Portanto, há uma pressão constante para expandir a escala econômica. Esse ciclo de aumento de produtividade e necessidade de expansão econômica é conhecido como a “armadilha da produtividade”.
Assim, por mais que a tecnologia avance, existem limites físicos e termodinâmicos para a eficiência. Mesmo com melhorias tecnológicas, não é possível produzir um caminhão utilizando metade da matéria-prima e da energia necessárias, especialmente quando se considera a fabricação de baterias e veículos elétricos.
A estratégia de “crescimento econômico verde” é enganosa e arriscada, pois cria a falsa impressão de que o desacoplamento absoluto entre crescimento econômico e impacto ambiental é algo simples de alcançar. Embora os investimentos em energias renováveis tenham crescido globalmente, o uso de combustíveis fósseis não diminuiu. A energia renovável não está substituindo os combustíveis fósseis, mas sim sendo adicionada ao mix energético para atender à demanda crescente impulsionada pelo crescimento econômico. Contrariando a crença comum de que o avanço tecnológico e a maior eficiência reduziriam os danos ambientais, o progresso tecnológico tem, na verdade, ampliado esses impactos.
Mesmo quando novas tecnologias aumentam a eficiência, isso frequentemente resulta em um maior consumo, já que os produtos se tornam mais acessíveis. Por exemplo, apesar de as televisões serem mais eficientes em termos de energia, as pessoas estão comprando TVs maiores, o que acaba elevando o consumo total de energia. Outro exemplo paradoxal é a popularização de SUVs e caminhonetes, que anula os ganhos de eficiência no consumo de combustível. A tecnologia pode melhorar a eficiência, mas esse benefício é muitas vezes neutralizado pelo efeito rebote, onde o consumo aumenta como resposta.
Quando as empresas acumulam recursos financeiros além do necessário, são incentivadas a buscar novas oportunidades de investimento. Contudo, não há certeza de que esses investimentos serão destinados a projetos sustentáveis. O chamado “keynesianismo climático” prioriza o estímulo ao mercado, mas não sua regulação. No entanto, o mecanismo de precificação do mercado não se mostra eficiente para diminuir as emissões de CO₂.
Adicionalmente, mesmo com o rápido avanço das energias renováveis, não há certeza de que a indústria petrolífera será automaticamente eliminada do mercado quando a competitividade do petróleo diminuir. Na verdade, quanto maior for a expectativa de que os preços do petróleo entrem em colapso no futuro, mais intensa será a extração de combustíveis fósseis, numa tentativa de maximizar a exploração desses recursos antes que se tornem obsoletos. Essa lógica é perigosa e insustentável. Portanto, é crucial que forças externas ao mercado atuem para reduzir as emissões de gases de efeito estufa, já que o mercado, por si só, não é capaz de resolver essa questão.
É essencial repensar profundamente os modelos de produção e consumo em massa que têm sustentado o crescimento econômico até os dias de hoje. Em 2019, mais de 10 mil cientistas alertaram que as mudanças climáticas estão diretamente ligadas ao estilo de vida das classes dominantes e defenderam mudanças radicais nos sistemas econômicos atuais. Os 10% mais ricos da população global são responsáveis por metade das emissões de CO₂, com destaque para o 0,1% mais privilegiado, que utiliza jatos particulares e carros de luxo. Em contraste, os 50% mais pobres emitem apenas 10% do total de CO₂. A crítica de que os mais ricos devem liderar a redução das emissões é totalmente válida e deve ser levada a sério.
Se as emissões dos 10% mais ricos fossem reduzidas ao nível da classe média europeia, as emissões globais de CO₂ cairiam em cerca de um terço. Isso nos daria um tempo valioso para avançar na transição para uma infraestrutura social sustentável. No entanto, enfrentar a crise climática será impossível sem que os mais ricos modifiquem radicalmente seu estilo de vida excessivo e predatório.
Chomsky e Pollin, inclusive, propõem um programa de taxação de carbono, começando com US
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20portonelada,oquegerariaumareceitadecercadeUS 625 bilhões anuais nos Estados Unidos. Essa taxa aumentaria o preço da gasolina em 20 centavos de dólar por barril, elevando o preço médio em 5% tendo como base o ano de 2020.
Os veículos movidos a gasolina estão entre os maiores emissores de CO₂ em escala global. A substituição desses veículos por equivalentes elétricos poderia abrir um mercado amplo e criar empregos, contribuindo para enfrentar tanto a crise climática quanto a econômica. No entanto, essa mudança não é tão direta quanto pode parecer, especialmente por causa das baterias de íons de lítio, componentes fundamentais para smartphones e veículos elétricos. A extração do lítio, concentrada em áreas como o Salar de Atacama, no Chile, envolve o bombeamento intensivo de água subterrânea em regiões secas, causando danos significativos ao ecossistema local, como a diminuição da população de flamingos andinos e a falta de água para comunidades que vivem nessas áreas. A Bolívia, que também possui grandes reservas de lítio, já sofreu até com interferências estrangeiras, supostamente financiadas por Elon Musk, dono da Tesla, segundo suas próprias declarações.
O problema é que, em vez do petróleo, outros recursos finitos estão sendo explorados de forma intensa no Sul Global para atender às demandas dos países desenvolvidos na luta contra as mudanças climáticas. O cobalto, por exemplo, é crucial para a produção de baterias de íons de lítio, e 60% dele é extraído na República Democrática do Congo, um dos países mais pobres e instáveis da África. A mineração de cobalto frequentemente envolve trabalho análogo à escravidão, incluindo o uso de crianças a partir de seis anos de idade, que recebem cerca de US$ 1 por dia. Esses trabalhadores enfrentam condições extremamente perigosas, passando horas em túneis insalubres e expostos a substâncias tóxicas que causam doenças respiratórias, cardíacas e mentais.
Do outro lado da cadeia global estão empresas como Tesla, Apple e Microsoft. É difícil acreditar que os líderes dessas corporações desconheçam as condições em que o lítio e o cobalto são extraídos. Essa exploração desumana dificilmente se alinha com os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) e a promessa de inovação tecnológica responsável.
Dados mostram que o consumo de materiais como minério de ferro, alumínio, aço e cobre cresce quase na mesma proporção que o PIB global. O uso total de recursos, incluindo minerais, combustíveis fósseis e biomassa, saltou de 26,7 bilhões de toneladas em 1970 para mais de 100 bilhões em 2017, com projeções de atingir 180 bilhões até 2050. Apenas 8,6% desses recursos são reciclados, e essa taxa está caindo, mesmo com o aumento acelerado do consumo. O chamado “crescimento econômico verde” do capitalismo é, na realidade, uma ilusão, pois a exploração da periferia global tornou-se condição essencial para a proteção ambiental nos países centrais.
A eficácia das políticas verdes nos países desenvolvidos é questionável. Não é sustentável que cada família possua múltiplos carros, mesmo que elétricos. Planos de montadoras para lançar SUVs elétricos apenas reforçam a cultura do consumo excessivo e o desperdício de recursos. Isso é o que se chama de “lavagem verde” ou greenwashing. Além disso, a produção de carros elétricos ainda depende do petróleo e emite CO₂ durante a extração de matérias-primas. Estima-se que, até 2040, o número de veículos elétricos aumente de 2 milhões para 280 milhões, mas isso reduzirá as emissões globais de CO₂ em apenas 1%. Enquanto isso, o número de carros a gasolina continuará crescendo. O crescimento econômico capitalista, baseado na produção em massa e no consumo desenfreado, dificulta a descarbonização. A tecnologia verde não é tão sustentável quando se analisa seu processo de produção.
Embora a transição para veículos elétricos e energias renováveis seja necessária, confiar apenas no otimismo tecnológico é um erro grave. Como Peter Norton aponta em seu livro “Autonorama”, há uma falsa promessa de um futuro sustentável sem mudanças no estilo de vida imperialista, que prioriza o consumismo em detrimento de uma mobilidade responsável e eficiente. As promessas de um futuro equilibrado, como as dos “Futuramas”, são renovadas a cada 25 anos em média, mas continuam distantes da realidade. Agora, estamos na era das promessas de automação do transporte, mas sem ações concretas que mudem o paradigma atual.
Qual é o sentido de desperdiçar recursos naturais e aumentar o impacto ambiental apenas para manter o uso de combustíveis fósseis? Em vez disso, devemos construir uma sociedade que não dependa deles. Especialistas precisam educar a população sobre as medidas necessárias para enfrentar a crise climática e pressionar políticos e burocratas a adotarem ações mais drásticas.
A transição para carros elétricos e energias renováveis é essencial, mas, se o objetivo for apenas manter o estilo de vida atual, ela será engolida pela lógica capitalista e pelo crescimento econômico insustentável. Precisamos reduzir a cultura de consumo que associa carros à independência e diminuir a quantidade de bens que consumimos. Investimentos em grande escala em reforma agrária, geração de energia solar, transporte público gratuito, ciclovias e habitações sustentáveis são indispensáveis. O Novo Acordo Verde deve focar na redução e desaceleração da economia, promovendo um modelo verdadeiramente sustentável e justo.
Para alcançar um Novo Acordo Verde ideal, como proposto por Chomsky e Pollin, é viável considerar que as emissões globais líquidas de CO₂ possam ser zeradas até 2050. Isso demandaria um investimento médio anual de 2,5% do PIB global, focado em duas principais áreas: primeiro, uma melhoria significativa na eficiência energética de edifícios, veículos, transportes públicos e processos industriais. Também se faz necessária uma expansão expressiva da oferta de energias renováveis, especialmente solar e eólica, em todos os setores da economia. Os investimentos em energias limpas deveriam ser divididos de forma equilibrada, com 50% provenientes do setor privado e 50% do setor público.
A ideia de um futuro com padrões de vida reduzidos não é atraente, mesmo que direcionada à elite dominante. Por isso, muitas empresas adotam o chamado greenwashing, ou “lavagem verde”, uma estratégia de marketing que busca transmitir uma imagem de sustentabilidade sem ações reais. É uma falsa preocupação ambiental, disfarçada de consciência ecológica, revelando apenas hipocrisia.
Kohei Saito defende que o decrescimento é uma estratégia essencial para evitar os piores cenários climáticos, levantando a questão sobre qual tipo de decrescimento devemos buscar. Ele argumenta que é praticamente impossível reduzir as emissões de CO₂ de forma rápida enquanto mantemos o crescimento econômico, sugerindo que abandonar esse modelo pode ser a melhor maneira de combater as mudanças climáticas. O atual sistema de desenvolvimento, focado no crescimento econômico, está se tornando insustentável, já que a maioria dos países prioriza suas necessidades em detrimento da sustentabilidade.
Saito apresenta dados que mostram como pequenos ajustes poderiam resolver grandes problemas globais. Por exemplo, um aumento de apenas 1% no fornecimento de calorias poderia salvar 850 milhões de pessoas da fome, enquanto fornecer eletricidade a 1,3 bilhão de pessoas que não têm acesso a ela aumentaria as emissões de CO₂ em apenas 1%. Além disso, erradicar a pobreza extrema exigiria apenas 0,2% da renda global. Isso indica que a prosperidade de uma sociedade depende mais da organização da produção, distribuição e alocação de recursos do que do crescimento econômico em si. Uma redistribuição justa dos recursos poderia levar a uma sociedade mais próspera, mesmo sem crescimento.
A questão central é como alcançar justiça social e sustentabilidade em um planeta interconectado. Saito reforça o alerta de que, se o mundo não avançar rumo a uma sociedade sustentável e justa, o planeta se tornará inabitável, ameaçando até mesmo a prosperidade dos países desenvolvidos. Questiona, ainda, a viabilidade de alcançar uma distribuição justa e permanente de recursos
A questão central é como alcançar justiça social e sustentabilidade em um planeta interconectado. Saito reforça o alerta de que, se o mundo não avançar rumo a uma sociedade sustentável e justa, o planeta se tornará inabitável, ameaçando até mesmo a prosperidade dos países desenvolvidos. Questiona, ainda, a viabilidade de alcançar uma distribuição justa e permanente de recursos dentro do sistema capitalista, argumentando que o capitalismo é disfuncional do ponto de vista da justiça global.
O filósofo japonês propõe uma transição para o decrescimento ou uma “economia em estado estacionário”, enfatizando a necessidade de reduzir a produção e o consumo em massa para diminuir a pegada material. Ele critica a ideia de que podemos ignorar a fome de 1 bilhão de pessoas ou o sofrimento das gerações futuras devido à degradação ambiental. A justiça global, segundo ele, não é apenas um ideal humanitário, mas uma necessidade para a sobrevivência da humanidade. A igualdade é a chave para garantir que todos, e não apenas os mais ricos, possam viver de forma sustentável.
Quatro cenários previstos por Kohei Saito
Agora, que estamos nos encaminhando para o final, é preciso destacar que o filósofo japonês Kohei Saito apresenta quatro cenários possíveis diante da crise climática de forma bastante prática.
- Fascismo Climático:
Descreve a manutenção do modelo capitalista de crescimento econômico, ignorando a emergência climática. Isso levaria a uma piora na qualidade de vida da maioria da população, com eventos climáticos extremos cada vez mais frequentes, enquanto os ultrarricos se beneficiariam do “capitalismo de desastre”, acumulando ainda mais riqueza. Nesse cenário, o Estado protegeria os interesses dos privilegiados e reprimiria os mais vulneráveis, incluindo refugiados ambientais. - Estado de Barbárie:
Surge com o aumento de refugiados ambientais e a diminuição da produção de alimentos, gerando fome e revoltas. Haveria um conflito entre os 1% mais ricos e os 99% restantes, resultando no colapso de governos autoritários e no caos generalizado, com uma luta desesperada pela sobrevivência. - Maoísmo Climático:
Propõe a formação de governos centralizados que adotariam medidas drásticas para evitar o colapso total. Nesse caso, ideais de livre mercado e democracia liberal seriam abandonados em favor de uma ditadura eficiente e igualitária, focada em combater a crise climática. - Comunismo de Decrescimento (Cenário “X”):
É visto pelo autor como a única solução sustentável. Ele propõe a criação de uma sociedade baseada em práticas de ajuda mútua e democracia voluntária, sem depender de Estados autoritários. Esse modelo preservaria a liberdade, a igualdade e a democracia, sendo considerado a última chance para a humanidade enfrentar a crise climática de forma justa e sustentável.
Trata-se de uma alternativa viável para enfrentar a crise ambiental porque as políticas focadas no crescimento econômico não são capazes de nos livrar da crise ambiental global, evidenciada pelas mudanças climáticas. Por isso, é essencial adotar uma nova mentalidade, e o decrescimento surge como uma opção relevante. A ideia é construir uma economia que priorize o bem-estar humano e a preservação da natureza.
O sistema capitalista, que busca um crescimento econômico sem limites, é o principal responsável pela degradação ambiental. O capitalismo é a raiz das mudanças climáticas e de outras crises ecológicas. Ele cria constantemente novos mercados para expandir lucros e acumular capital, transformando até mesmo desastres ambientais em oportunidades de ganho. Esse fenômeno é conhecido como “capitalismo de desastre”. Por exemplo, incêndios florestais aumentam a venda de seguros, e o crescimento de pragas impulsiona o mercado de pesticidas.
O capitalismo está alterando drasticamente o planeta, tornando-o inóspito para a vida humana. Esse será o fim da era do Antropoceno. Portanto, é urgente confrontar o capitalismo e buscar alternativas.
Uma proposta é o “Novo Acordo Verde sem crescimento”. No entanto, discutir o decrescimento dentro do capitalismo é arriscado, pois pode ser associado à estagnação e ao declínio. É preciso controlar o fundamentalismo de mercado do neoliberalismo e desafiar o capitalismo, já que a combinação entre capitalismo e decrescimento é inviável. A essência do capitalismo, que consiste em lucro, expansão de mercados, exploração de trabalhadores e da natureza, é incompatível com a sustentabilidade.
Nossa sociedade tem buscado aumentar o PIB, acreditando que o capitalismo traz prosperidade. No entanto, essa prosperidade não é acessível a todos. “Por quanto tempo continuaremos a nos guiar por indicadores tão imprecisos, mesmo com tanto avanço tecnológico?”, indaga Saito.
Precisamos de um novo modelo econômico que reduza desigualdades, amplie a segurança social e promova o lazer, respeitando os limites do planeta. Devemos cortar o consumo excessivo, como SUVs e o fast fashion, entre outras coisas, ao invés de áreas essenciais como educação, seguridade social ou artes.
Acordos superficiais com o capitalismo não são suficientes. É necessário enfrentar questões teóricas e práticas mais complexas. Neste momento crucial da história, devemos confrontar o capitalismo de forma decisiva. A teoria do decrescimento propõe uma transformação radical do trabalho, superando conflitos de classe, exploração e dominação, para estabelecer uma sociedade livre, igualitária, justa e sustentável. Precisamos de teorias e práticas que questionem o capitalismo e promovam uma transição voluntária para uma sociedade pós-crescimento. Essa nova geração de pensamento deve incorporar uma crítica mais profunda ao capitalismo, aproximando-se do conceito de “comunismo”.
Um conceito central é o “comum”, que, segundo Karl Marx, refere-se à riqueza compartilhada e gerida coletivamente, com participação democrática e horizontal. Para o filósofo alemão, o comunismo significava um sistema em que os produtores administram conjuntamente os meios de produção e os recursos naturais, tratando a Terra como um bem comum.
O capitalismo, ao aumentar as forças produtivas, gera a crise ambiental. A interação humana com a natureza, por meio da produção, consumo e descarte, tem levado ao desmatamento excessivo, alterações climáticas e perda de terras férteis. O aumento da temperatura e a aridez ameaçam a agricultura e podem levar ao colapso da civilização.
Sustentabilidade e igualdade social estão interligadas. O capitalismo destrói a capacidade de regeneração da natureza, tornando impossível um aumento sustentável da produtividade. Ele explora a ciência para extrair recursos naturais, intensificando a degradação ambiental.
Uma economia estacionária, baseada na sustentabilidade e na igualdade, pode servir como resistência ao capital e fundamentar uma sociedade futura. Nessa visão, a riqueza cooperativa e a gestão comunitária são essenciais para criar uma sociedade mais justa e sustentável.
Agora que o capitalismo globalizado atingiu uma escala sem precedentes, ameaçando a existência humana, é hora de considerar o comunismo de decrescimento proposto por Marx. Se não agirmos para frear o capitalismo, a atividade econômica descontrolada destruirá o meio ambiente, colocando um fim à história humana.
Os 26 indivíduos mais ricos do mundo detêm a mesma riqueza que os 3,8 bilhões mais pobres, quase metade da população global. O capitalismo gera escassez para a maioria, aumentando a pobreza e reduzindo a riqueza pública. Precisamos de um sistema que reconstrua os bens comuns e restaure a abundância.
O controle popular dos “comuns” é essencial. Energias renováveis, como solar e eólica, são abundantes e descentralizadas, dificultando sua monetização pelo capital. Isso cria um conflito entre a “escassez de capital” e a “abundância de bens comuns”. A “cidadanização” é crucial para a difusão das energias renováveis, permitindo o controle democrático e em pequena escala.
O “comum” não se limita a recursos como eletricidade ou água; é necessário transformar os meios de produção em bens comuns. Em um sistema voltado para o lucro, trabalhos essenciais são mal remunerados, perpetuando desigualdades. Cooperativas podem transformar esses trabalhos em atividades independentes e atrativas, promovendo a igualdade e revitalizando comunidades.
A mudança deve ser sistêmica. Cooperativas podem ser a base para uma sociedade mais justa, combatendo a pobreza, a discriminação e a desigualdade geradas pelo capitalismo. A restauração da abundância radical é possível em diversas áreas, como educação, medicina e economia compartilhada.
Através do “comum”, as pessoas podem gerir coletivamente as atividades de produção, reduzindo a escassez artificial e aumentando a abundância. Isso não significa empobrecimento, mas sim mais tempo livre e menos dependência do trabalho excessivo. O decrescimento não implica em pobreza, mas em uma vida mais equilibrada e sustentável.
A desigualdade de riqueza entre os mais ricos e os 99% deve ser corrigida, eliminando a escassez artificial e reduzindo as horas de trabalho. O capitalismo, baseado na escassez, é o verdadeiro responsável pela pobreza.
O filósofo japonês Kohei Saito argumenta que o comunismo de decrescimento pode resolver a crise climática. As mudanças climáticas, assim como a pandemia de COVID-19, são produtos do capitalismo. Estratégias como as adotadas por Donald Trump e Jair Bolsonaro exemplificam o “capitalismo de desastre”, que explora crises para benefício próprio.
O economista francês Thomas Piketty critica a concentração de poder nas mãos de poucos acionistas, que priorizam lucros em detrimento do bem-estar coletivo. A agricultura urbana, por exemplo, pode promover a sustentabilidade e a conscientização ambiental, reduzindo a dependência de veículos poluentes.
O comunismo de decrescimento propõe uma transição para uma economia sustentável, desafiando a lógica capitalista de crescimento infinito. Em vez de focar no aumento do PIB, o objetivo é satisfazer as necessidades básicas das pessoas, reduzindo o consumismo e promovendo a autolimitação.
A redução da jornada de trabalho pode melhorar a qualidade de vida e reduzir o impacto ambiental. Sob o capitalismo, a automação é vista como uma ameaça, mas no comunismo, ela pode ser uma ferramenta para libertar os trabalhadores de tarefas sem sentido.
O capitalismo, ao buscar lucro e crescimento incessantes, não é capaz de proteger o meio ambiente. Ele transforma tanto humanos quanto natureza em objetos de exploração. As cidades precisam de uma nova racionalidade urbana, com mais áreas verdes, transporte público e produção local. Medidas como a restrição de veículos poluentes e a redução de resíduos são essenciais, mas exigem enfrentar grandes corporações.
A justiça climática reconhece a necessidade de parar as mudanças climáticas e reparar as injustiças sofridas pelas comunidades mais afetadas. Para uma sociedade sustentável e justa, é preciso desafiar o imperialismo ecológico e promover mudanças globais.
Ganhar tempo com medidas paliativas é perigoso. Os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável da ONU precisam ser criticados, pois não são suficientes. É necessária uma transição revolucionária, com propriedade comunitária de recursos e infraestruturas.
A renovação democrática é crucial para enfrentar as mudanças climáticas. O “comum” como gestão horizontal dos meios de produção é a base do comunismo. Confiar apenas no Estado pode levar ao “maoísmo climático”, mas o comunismo oferece uma alternativa viável. Precisamos discutir abertamente o significado do trabalho, da vida, da liberdade e da igualdade. A confiança e a ajuda mútua, destruídas pelo neoliberalismo, devem ser restauradas.
Agora, gostaria de lhes dizer que há esperança. Em seu livro, Saito conta que, segundo a cientista política Erica Chenoweth, se 3,5% da população se mobilizar de forma não violenta, a sociedade pode mudar significativamente. Portanto, chegou o momento da ação: é hora de agir, coletar assinaturas para a declaração de emergência climática e exigir que os mais ricos assumam sua responsabilidade. “Não podemos usar a complexidade da reforma do sistema como desculpa para a inação. A participação de cada indivíduo é crucial. O poder dos 99% pode limitar o capital, renovar a democracia e construir uma sociedade descarbonizada. É hora de dizer não ao cinismo e agir agora“.
Uma resposta
Parabéns pelo artigo e a ampla pesquisa realizada. O tema é oportuno e deveria merecer cada vez mais atenção por parte dos governos, sejam de que natureza forem, mas sobretudo das pessoas comuns que tem o poder de modificar essa quadro com união e persistência.