O estudo “Acelerando a Transição: Estratégia para Eletrificar a Frota Brasileira de Ônibus até 2030“, lançado pelo ITDP Brasil em agosto de 2025, apresenta um diagnóstico detalhado e propostas concretas para descarbonizar o transporte público urbano, setor responsável por 9% das emissões de gases de efeito estufa (GEE) do país. Com base em dados operacionais de 21 regiões metropolitanas, a pesquisa revela que a substituição imediata de ônibus a diesel por modelos elétricos não só mitigaria impactos climáticos, mas também reduziria custos sociais em até R$ 252 milhões anuais, vinculados a doenças respiratórias e cardiovasculares causadas pela poluição.
A análise abrange 46.236 veículos em operação, dos quais 73,7% têm tecnologia ultrapassada (Euro III e Euro V 5+), com idade média superior a cinco anos. Esses modelos emitem 1,78 milhão de toneladas de CO₂eq anualmente, equivalente à poluição de 400 mil carros particulares. O estudo identifica 14.146 ônibus (37,8% da frota analisada) como prioritários para substituição, sendo estes veículos convencionais (padron e básico) com consumo diário de energia abaixo de 264 kWh, compatível com a capacidade de baterias disponíveis no mercado nacional. A eletrificação dessas unidades reduziria 24,6% das emissões do setor, poupando R$ 54 milhões em custos sociais por ano.
O Brasil já dispõe de um mercado competitivo, com nove fabricantes e 25 modelos de ônibus elétricos, a maioria nas categorias padron e básico. A transição exigiria investimentos de R$ 44,5 bilhões até 2030 (R$ 8,9 bi/ano), viabilizados por linhas de crédito como as do Novo PAC. O cálculo considera o Custo Total de Propriedade (TCO), que, em cenários como o de São Paulo, já é 11% menor para elétricos devido à economia em combustível e manutenção.
Apesar do potencial, o estudo alerta para entraves como a falta de transparência de dados, já que 40% das cidades analisadas não compartilham informações sobre rotas, frota ou consumo energético, dificultando o planejamento. O ITDP propõe medidas urgentes, incluindo a padronização de contratos, como a inclusão de cláusulas que obriguem operadoras a fornecer dados de GPS e bilhetagem eletrônica em tempo real; centralização de compras, que visa unificar licitações de veículos para reduzir custos e atrair fabricantes; infraestrutura de recarga por meio da priorização dos terminais em corredores de alta demanda, com apoio técnico e financeiro para projetos locais.
Impactos na Saúde e Equidade
A poluição do ar mata 8,1 milhões de pessoas globalmente por ano — no Brasil, 465 crianças menores de cinco anos morrem diariamente por doenças relacionadas. Ônibus elétricos eliminam 90% das emissões de CO₂ e reduzem a poluição sonora, fator de risco para doenças cardiovasculares. A eletrificação focalizada em regiões metropolitanas como Rio, São Paulo e Belo Horizonte, onde a frota é mais antiga, traria benefícios imediatos para 42% da população brasileira.
O estudo defende uma estratégia nacional integrada, vinculando metas climáticas (NDCs) à renovação de frotas. Entre as ações prioritárias, destaque para a criação de um repositório federal de dados (via SIMU) para monitorar emissões e operação; subsídios direcionados para condicionar repasses à substituição de ônibus Euro III e V; modelos de negócio inovadores por meio de contratos por quilômetro rodado, para atrair investimentos privados.
Janela de Oportunidade
Com 64% dos municípios brasileiros operando frotas envelhecidas, a eletrificação é uma agenda urgente de saúde pública, clima e eficiência econômica. O plano do ITDP mostra que a transição é técnica e financeiramente viável, mas depende de vontade política para superar fragmentação institucional e interesses setoriais. Como resume Bernardo Serra, coordenador da pesquisa: “Priorizar veículos antigos em regiões de alta densidade é o caminho mais rápido para limpar o ar e economizar recursos públicos“.