A transição para sistemas de transporte público com emissão zero é um imperativo global para combater as mudanças climáticas, melhorar a qualidade do ar e promover equidade social. No centro dessa transformação estão os ônibus elétricos a bateria (BEB), que representam uma alternativa viável e sustentável aos veículos com motores de combustão interna, de acordo com especialistas. No entanto, a implementação bem-sucedida desses sistemas requer mais do que a simples substituição de frotas; exige um planejamento abrangente que integre tecnologia de baterias, infraestrutura de carregamento e uma estratégia operacional robusta. Por isso, o ITDP apresentou um relatório – intitulado “Ônibus Elétricos: Guia de Baterias e Recarga” – que analisa os aspectos técnicos críticos para a adoção eficiente de ônibus elétricos, com foco no interesse público e na sustentabilidade urbana. Clique aqui para ler o estudo na íntegra.
As baterias são o componente mais crítico e caro dos ônibus elétricos, representando cerca de 40% do custo total do veículo. Atualmente, as baterias de íon-lítio dominam o mercado, com duas químicas principais: LFP (lítio-ferro-fosfato) e NCM (níquel-cobalto-manganês). As baterias LFP, predominantes em mercados como China, América Latina e África, oferecem maior segurança, estabilidade térmica e vida útil mais longa, embora com densidade energética ligeiramente inferior. Já as NCM, mais comuns na Europa e América do Norte, proporcionam maior autonomia, mas têm custos mais elevados e preocupações relacionadas à volatilidade no preço do cobalto e níquel.
A vida útil das baterias varia entre 6 e 12 anos, dependendo de fatores como condições climáticas, topografia, carga de passageiros e uso de sistemas auxiliares (como ar-condicionado). Em operações reais, a autonomia anunciada pelos fabricantes (250–300 km) pode ser reduzida para 200–225 km devido a essas variáveis. Práticas como manter o estado de carga (SoC) entre 20% e 80% e utilizar frenagem regenerativa podem prolongar a vida útil da bateria e melhorar a eficiência energética.
O fim da vida útil das baterias apresenta desafios ambientais e logísticos. A reciclagem, embora capaz de recuperar até 95% dos minerais críticos, ainda carece de padronização e regulamentação robusta. Alternativamente, a reutilização em aplicações de armazenamento estacionário (como energia solar) oferece uma segunda vida para baterias que retêm 80% de sua capacidade, reduzindo a demanda por novos materiais e mitigando impactos ambientais.
A infraestrutura de carregamento é determinante para a eficiência operacional e econômica dos sistemas de BEB. Existem três estratégias principais: carregamento em depósito, carregamento de oportunidade e carregamento misto.
O carregamento em depósito, geralmente realizado durante a noite, utiliza carregadores plug-in de 40–125 kW, exigindo baterias maiores (250–500 kWh) e espaço adicional nos pátios (15–30% a mais que depósitos convencionais). Essa estratégia é ideal para rotas curtas (até 230 km) e oferece menores custos de energia devido à tarifação fora de pico. No entanto, requer ajustes operacionais para garantir que os ônibus retornem ao depósito para recarga.
O carregamento de oportunidade, realizado em pontos ao longo das rotas (terminais ou paradas), utiliza tecnologias como pantógrafos ou carregamento rápido, permitindo recargas parciais em minutos. Essa abordagem permite baterias menores (50–250 kWh) e rotas mais longas, mas exige investimentos significativos em infraestrutura e pode sobrecarregar a rede elétrica durante horários de pico. Estratégias mistas combinam ambas as abordagens, oferecendo flexibilidade operacional e eficiência energética, mas com maior complexidade de gestão.
A localização da infraestrutura deve priorizar áreas com capacidade de rede suficiente, proximidade com rotas e terrenos disponíveis. A descentralização dos pontos de carregamento pode reduzir impactos na rede, enquanto a integração com fontes renováveis (como energia solar) aumenta a resiliência do sistema.
A implementação bem-sucedida de BEB requer um planejamento holístico que envolva governos, operadores de transporte, fabricantes, concessionárias de energia e sociedade civil. Mapear incentivos políticos e regulatórios em níveis nacional, regional e local é essencial para alinhar objetivos e recursos. Modelos de responsabilidade institucional (público, privado ou misto) devem ser avaliados para definir papéis e investimentos.
A seleção de rotas para eletrificação deve priorizar corredores com alta demanda, conexões com outras modalidades e benefícios para populações vulneráveis. Dados operacionais (como distância, topografia e consumo energético) devem informar a escolha de baterias e estratégias de carregamento. Projetos-piloto são fundamentais para testar tecnologias e ajustar operações antes da escalabilidade.
O envolvimento precoce das concessionárias de energia é crucial para avaliar a capacidade da rede, negociar tarifas e planejar upgrades necessários. Além disso, a capacitação técnica de motoristas e mecânicos é vital para otimizar o desempenho dos veículos e prolongar a vida útil das baterias.
A transição para ônibus elétricos representa uma oportunidade única para repensar a mobilidade urbana, reduzir desigualdades e promover justiça ambiental. A priorização de rotas que servem comunidades de baixa renda maximiza os benefícios sociais, enquanto a comunicação transparente com a população fortalece o apoio às mudanças.
A adoção de padrões interoperáveis para conectores e software (como o Sistema de Carregamento Combinado – CCS) garante flexibilidade e evita dependência de fabricantes específicos. Além disso, o planejamento para reutilização e reciclagem de baterias é essencial para minimizar impactos ambientais e financeiros.
Em suma, a eletrificação de frotas de ônibus exige uma abordagem integrada que balance aspectos técnicos, operacionais e sociais. Com planejamento cuidadoso e colaboração entre partes interessadas, as cidades podem implementar sistemas de transporte limpos, eficientes e equitativos, beneficiando tanto as pessoas quanto o planeta.