GWM escolhe o Brasil como ponte de lançamento global de caminhões a H2

Montadora chinesa inicia operação nacional com estratégia cautelosa de validação tecnológica e parcerias, visando frotistas com meta de descarbonização

Por Gustavo Queiroz

- setembro 3, 2025

Davi Lopes, líder da GWM Hydrogen-FTXT Brasil

Em um movimento estratégico que sinaliza a aposta em um nicho de alta tecnologia e sustentabilidade, a GWM, através de seu braço especializado GWM Hydrogen-FTXT, inicia sua operação no Brasil focada em veículos pesados com células de combustível a hidrogênio. A empresa, que já possui mais de 1.200 unidades entre caminhões e ônibus rodando na China, acumulando mais de 40 milhões de quilômetros de experiência, escolheu o país como a primeira base fora do território chinês para desenvolver este novo mercado, atraída pelo potencial brasileiro na produção de hidrogênio de baixo carbono. A estratégia de entrada, todavia, é gradual e meticulosa, priorizando a validação tecnológica em condições locais e a construção de parcerias antes de qualquer comercialização em escala.

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De acordo com Davi Lopes, líder da GWM Hydrogen-FTXT Brasil, a empresa está em fase de testes e prospecção. “Chegamos ao Brasil em agosto e trouxemos uma unidade do caminhão para fazer o teste embarcado dessa célula combustível nas condições brasileiras. O que nos interessa, enquanto GWM Hydrogen e FTXT, é o que está dentro, no coração desse caminhão, que é a célula a combustível“, explica Lopes. O executivo enfatiza que a tecnologia, embora nova no Brasil, é consolidada globalmente há décadas, utilizada até mesmo em missões espaciais pela NASA devido à sua confiabilidade em sistemas isolados.

O modelo de negócios da companhia não se restringe à venda de veículos. Segundo o executivo, a visão é oferecer um sistema completo de descarbonização, abrangendo a tecnologia de célula combustível para aplicações móveis e estacionárias. “A gente não quer ser simplesmente um vendedor de célula combustível. Queremos vender a solução completa para que o cliente não se sinta perdido em uma tecnologia nova“, afirma Lopes. Isso inclui, no futuro, suporte técnico, telemetria para antecipação de problemas e uma estrutura de serviços que garanta a operação contínua dos equipamentos.

Segundo o executivo, o público-alvo inicial são grandes frotistas com uma agenda clara e robusta de descarbonização, notadamente do setor agrícola e de logística, que buscam não apenas reduzir emissões de poluentes locais (NOx e material particulado), mas também neutralizar gases de efeito estufa em suas cadeias de valor para gerar créditos de carbono e agregar valor premium aos seus produtos no mercado internacional. “Os clientes que vão utilizar tecnologias de baixo carbono são os que já têm uma estratégia bem clara com a descarbonização de frotas. Eles podem intensificar os produtos aqui do Brasil, que já têm uma pegada baixa no campo, com uma tecnologia de distribuição também de baixo carbono“, projetou Lopes.

Caminhão GWM Brasil
Tempo de abastecimento de hidrogênio deverá ser de 5 minutos, garantindo maior disponibilidade do veículo na comparação com propulsores puramente elétricos | Foto: Divulgação

Um dos maiores desafios, a infraestrutura de abastecimento, está sendo enfrentado através de parcerias com universidades e instituições de pesquisa. Lopes revela que até o final deste ano, o estado de São Paulo deverá contar com três Hydrogen Refueling Stations (HRS – estações de abastecimento de hidrogênio), somando-se a outras já em operação ou em fase final de implantação em Minas Gerais, Brasília, Bahia e Pernambuco. “A partir de fevereiro do ano que vem, vamos começar a ter possivelmente corredores verdes entre regiões e estados onde os clientes poderão testar esse caminhão em condições reais“, complementa. Projetos como o reformador de etanol da USP, que extrai hidrogênio do biocombustível, são apontados como fundamentais para criar uma economia local do hidrogênio verde, integrando o agronegócio à mobilidade de baixo carbono.

Sobre a viabilidade econômica, Lopes é pragmático: o TCO (Total Cost of Ownership) da tecnologia só se justificará plenamente para quem possui uma estratégia de descarbonização. “Se formos simplesmente trocar qualquer tecnologia por outra, a conta não vai fechar. Mas se você tem um serviço de baixo carbono que agrega valor ao seu produto, naturalmente você vai cobrar um pouco mais caro“, analisa, fazendo uma analogia com aplicativos de transporte que já cobram mais por veículos elétricos. A manutenção, por sua vez, é vista como mais simples que a de um motor a combustão, com a célula combustível sendo modular e permitindo a substituição de stacks (conjuntos de células) específicos em caso de contaminação por impurezas no hidrogênio, um dos poucos pontos de atenção.

Além dos caminhões, a GWM Hydrogen-FTXT explora outras frentes no Brasil. O projeto GWM Náutica COP30 é uma iniciativa brasileira que apresentará um barco movido a hidrogênio verde para ser exibido na COP30, em Belém (2025). Liderado pela JAQ Apoio Marítimo e pelo Parque Tecnológico Itaipu, com apoio da GWM, o objetivo principal é demonstrar a viabilidade do transporte marítimo com zero emissões de carbono.

Outras possibilidades de aplicação de energia estacionária incluem sua utilização como backup para hospitais ou para gerar eletricidade em garagens de ônibus elétricos onde a rede de alta tensão é insuficiente. “Temos um leque muito grande de uso desta tecnologia. A transição energética reúne um pool de novas energias e tecnologias que cada cliente vai escolher dependendo da sua agenda e do seu orçamento“, conclui Lopes.

O primeiro caminhão da GWM já está no Brasil | Fotos: Divulgação
O primeiro caminhão da GWM já está no Brasil | Fotos: Divulgação
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