Um levantamento sobre a criminalidade dirigida ao transporte rodoviário de cargas no Estado de São Paulo revela um cenário dinâmico e em transformação. Dados consolidados do Boletim Tracker-Fecap, referentes ao período de janeiro a agosto de 2025, indicam uma mudança significativa no modus operandi de quadrilhas especializadas, com um aumento alarmante de roubos em contrapartida a uma redução nos furtos, além de uma migração geográfica dos crimes para novas rotas e municípios.
Em agosto de 2025, o estado registrou um salto de 39,4% no número de roubos de caminhões na comparação com o mesmo mês de 2024, totalizando 145 ocorrências, uma média de um caminhão roubado a cada cinco horas. Em sentido oposto, os furtos, caracterizados pela ausência de violência ou grave ameaça à pessoa, apresentaram uma redução de 41,6% no mesmo período, com 45 registros. Na análise do acumulado de janeiro a agosto, os roubos tiveram uma leve queda de 3,8% (de 796 para 766), enquanto os furtos caíram 20,4% (de 382 para 304).
Para o pesquisador Erivaldo Vieira, da Fundação Escola de Comércio Álvares Penteado (FECAP), responsável pelo estudo, essa disparidade sugere uma possível eficácia de medidas de segurança preventivas em locais estacionários ou uma nítida mudança na estratégia criminosa. “Os dados sugerem que os criminosos podem estar se deslocando para outras modalidades ou regiões, privilegiando a ação violenta sobre a oportunista“, analisa Vieira.
O estudo detalhado evidencia uma reconfiguração no mapa da criminalidade contra cargas. Municípios como Cubatão, Osasco, Paulínia, Santos e Sumaré deixaram o ranking das dez cidades com maior incidência, sendo substituídos por Itatiba, São Bernardo do Campo, Limeira, Itaquaquecetuba e Jundiaí.
Segundo Vitor Corrêa, gerente de Comando e Monitoramento do Grupo Tracker, essa mudança é alarmante. “A entrada desses novos municípios no ranking de 2025 sugere que novas rotas e polos logísticos estão se tornando alvos de quadrilhas especializadas, provavelmente acompanhando o crescimento logístico e o fluxo rodoviário. As ocorrências estão sempre próximas de rotas de transporte de carga e zonas industriais, o que reforça a relação direta entre o crime e o fluxo de mercadorias“, afirmou.
A vulnerabilidade das principais artérias rodoviárias do estado foi confirmada pelo mapeamento. A Rodovia Fernão Dias (BR-381), que conecta São Paulo a Minas Gerais, aparece como o logradouro mais crítico, concentrando ocorrências em três municípios diferentes: Guarulhos (20), São Paulo (17) e Mairiporã (8). A Rodovia Régis Bittencourt (BR-116), que segue para o Paraná, e a Rodovia Anhanguera (SP-330), que serve ao interior do estado, também figuram entre as vias com maior número de eventos.
A análise confirma que a logística paulista, organizada em cinco grandes eixos (Anhanguera-Bandeirantes, Dutra-Fernão Dias, Régis Bittencourt, Anchieta-Imigrantes e Dom Pedro I), é o palco principal desses crimes. A predominância de eventos em vias públicas (74,6%) e rodovias (9,9%) indica que os crimes acontecem majoritariamente durante o deslocamento das cargas, exigindo uma resposta rápida e integrada entre tecnologia de rastreamento e forças de segurança.
Alvos definidos
Os criminosos demonstram alto grau de especialização na escolha dos alvos. Os caminhões-tratores das marcas Volvo e Scania, notadamente os modelos FH 540, R450 e FH 460, dominam o topo da lista de veículos mais visados. Esses equipamentos, utilizados predominantemente em transporte de longa distância e operações logísticas de alto valor, concentraram o maior número de ocorrências.
“O predomínio de caminhões-tratores reforça o foco em grandes cargas interestaduais, frequentemente desviadas em rotas de conexão entre os polos logísticos de São Paulo, Campinas e Baixada Santista“, salienta Erivaldo Vieira. O pesquisador complementa que a tendência de maior incidência em caminhões modernos reforça a tese de que o valor de revenda de peças e componentes no mercado ilegal é um dos principais motivadores das ações criminosas.
A análise temporal aponta que a terça-feira é o dia da semana com pico de ocorrências, sendo que terça, quarta e quinta-feira concentram 57% do total. “Os picos de eventos coincidem com o pico das operações de transporte e entrega. Essa inteligência orienta nossas estratégias de monitoramento, com reforço de vigilância em horários e rotas críticas, quando o risco é maior e a mobilização das quadrilhas mais intensa. Essa abordagem proativa é decisiva para garantir a integridade do veículo, da carga e do motorista“, explicou Vitor Corrêa.
Os dados apresentados pelo Boletim Tracker-Fecap apontam para a necessidade de estratégias de segurança pública e privada cada vez mais sofisticadas e baseadas em inteligência. O combate a esse tipo de crime organizado exige mais do que apreensões pontuais.
A integração de dados entre departamentos de trânsito (Detrans), seguradoras e plataformas digitais é fundamental para rastrear e desmontar as redes criminosas. A fiscalização orientada por inteligência, concentrando esforços em rotas, horários e modelos de veículos mais visados, mostra-se como uma medida de eficácia comprovada.
 
				
